quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Amores ilusórios - separações sem despedida. 5

O coração que perdeu o encaixe.

                Lembro ainda hoje de nossas piadas, nossos jargões e nossa corrente. Inseparáveis que éramos. Foi, talvez, o sentimento mais puro e mais intenso que em mim brotou. Nossa amizade ficou marcada, apesar de o tempo borrar um monte de lembranças de nós. Falando em nós, muitos foram os que atamos e desatamos. Muitos fomos nós. Talvez o maior arsenal de faces que eu tenha descoberto em mim foi com você. Doeu nossa separação, não doeu? Pra mim doeu. Foi lenta, estupidamente lenta. Aos poucos te perdi. Deixei pra trás o meu abraço mais confortante. Tanta coisa, tanta coisa! Eu juro pra você que, se eu fosse o pingente de coração de nossa corrente, preferiria nunca ter existido. Pobre pingente solitário. Ainda amo a maneira como ele reflete no sol e o encaixe perfeito que tinha com o seu. Pena os dois nunca mais terem se visto.
                Ainda acho que fomos egoístas e descuidados. Uma ligação que fosse poderia ter nos mantido vivos todos os dias. Que tempo perderíamos? Imagina como seria bom uma separação brusca... Eternizaríamo-nos no auge de nossas venturas. Você foi, por anos, meu êxtase total. E lembro agora de minha fascinação por te rodear e te confiar todos os meus amores e dissabores. E quantos foram, e quantos fomos... E quantos somos hoje.
                Ainda guardo as cartas e os rabiscos e as piadas e o texto que eu fiz pra você, e você pra mim, todos em uma caixa forrada com um papel bem colorido, pra lembrar nossa amizade arco-íris. Linda, intocável e imaculada amizade. Como pode ter-se perdido? Quando relembro, surge a dor da distância incalculável de nossos corações. Nesses últimos dias voltei a ouvir nossas músicas. Sim, nossas. E junto delas vieram as historinhas sutis e as graças. Peguei-me rindo sozinha tantas vezes! Temos um mundo todo particular. Talvez nem seja mais nossos. Nem nós somos mais quem eram os “nós” daquele tempo de ouro. Minhas lembranças mudas estão me petrificando... Queria que fosse impossível tirar um dia o seu nome do meu coração. Hoje dói saber que podíamos ser nada mais do que somos somente entre nós. Você poderia ser madrinha do meu casamento, dos meus filhos, das minhas lembranças... Minha eterna madrinha.
                Será mesmo que nunca morreremos? Porque em mim tudo está tão vivo... Tão longe, mas tão vivo! Somos cheios de promessas e cheios de contratos pela metade. Eu jurei não perder a gente, e perdi, e você também perdeu, e hoje somos amigos que se cruzam na rua com um sorriso amarelo, envergonhados de não termos corrido um pouquinho mais. As fotos, as palavras perdidas no meio do conteúdo do caderno, alguns vídeos e muitas lembranças fazem parte de um repertório só nosso, cravado no fundo de um baú doloroso de se remexer. Disseram que “quando mais mexe, mais fede”. Posso dizer que nosso aroma é doce, sempre doce. Os anos passaram e nossa amizade estacionou em uma via muito movimentada. Movimentada demais para querermos nos importar com seu peso. Tínhamos muitos outros para levar dali adiante. Nossos corações decididamente pela metade. E sei que nem adianta voltar, o “fardo” petrificou de tanto esperar para seguir conosco. Queria te chamar para um café e pedir para você usar de novo a correntinha. Porque nunca deixei de usar a minha, nem que seja em pensamento, a cada início de manhã que eu olhava para ela pendurada no espelho e queria que tudo fosse inteiro outra vez.

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