sábado, 13 de agosto de 2016

Os olhos nus.

Sem intenções. Sem novidades. Estavam apenas nus, aqueles olhares. Dois desconhecidos que ergueram os olhos ao mesmo e tempo e se descobriram perplexos ao se encararem forçadamente.

É curioso como o olhar nos entrega. Não é à toa que chamam os olhos de “janelas da alma”. Quando fitamos sem querer alguém que também encontra nossos olhos sem intenção, é como se as janelas estivessem com as cortinas abertas e lá no cômodo alguém troca de roupa furtivamente, na tentativa de não ser pego em flagra. E assim como rapidamente se desvia o olhar, rapidamente se fecham as cortinas na tentativa de que o embaraço seja amenizado, como se fosse um grão de areia ao invés de um elefante desengonçado entre as duas grandes janelas.

O porquê de desviarmos o olhar tão pasmos como se tivéssemos sido invadidos, não sei. Mas sei que congelo cada vez que meu olhar se descobre nu sobre a nudez de outro par de olhos – uma intimidade repentina, um soco na boca do estômago, uma cilada, Bino! – e fico me perguntando se é um sinal do universo ou coisa parecida cruzar duas janelas distantes ao mesmo tempo. Quem sabe seja essa a agulha no palheiro do mundo dos olhares.

Talvez seja utopia, mas espero que um dia estejamos preparados para olhar o mundo de maneira nua e despretensiosa, sem medo de sermos pegos por outros olhares nus. Sem mascarar nada. Sem que precisemos fechar as cortinas, porque da janela só se verão coisas bonitas.

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Você é insubstituível, mas não imprescindível.

Escrevi uma mensagem de texto pra você. Reli pela quarta vez. Movi meu dedão pra chegar próximo ao botão “enviar”. Desisti. Apaguei o terceiro projeto de te chamar. Não via sentido. Aos poucos, a vontade de querer você por perto vai morrendo.

Parece uma flor mesmo essa coisa de gostar de alguém. Vai perdendo a cor, o cheiro bom, a postura e a vida se a gente não nutrir. Até que perde a graça e você nem sabe mais de onde tirou água pra dar de beber a um sentimento que hoje não faz o mínimo sentido pra nenhum dos dois.

Hoje à tarde passei naquela rua que nos despedíamos. Você ia pro trabalho, eu pra faculdade. Pensei em como uma pessoa pode mudar o sentido de algumas coisas quando estamos dispostos a deixar ela brotar pelas paredes da nossa vida feito hera. Uma rua! Uma rua que agora está marcada por beijos de despedidas, desejos de “boa aula!” e “bom trabalho!” e olhares de saudade antecipada. Uma rua onde o amor passou e deixou cair suas pétalas.

Ninguém vai passar por aquela rua comigo da maneira como você passou. Ninguém vai parar naquela esquina e despejar amor em mim como você despejou. Mas eu vou passar naquela rua mais mil vezes e talvez por mil vezes eu lembre de nós dois. Ou talvez por quinhentas vezes. Ou trezentas e doze vezes. Talvez algum dia eu passe por essa rua com alguma amiga indo comer cachorro quente e nem me lembre de você ao cruzar a esquina. Ou talvez eu passe por ali com um novo alguém, que não vai despejar amor em mim como você, mas vai despejar de outro jeito e tenho certeza que vai fazer meu coração pular tanto quanto você fez. O fato é que vou encontrar outros jeitos de passar por aquela rua e a vida vai seguir florescendo como quando passava por ali antes de você.

Ninguém vai ser você. Ninguém vai rir como você ria, nem vai me enlouquecer como você me enlouquecia, ninguém vai me deixar brava como você me deixava. Ninguém vai ser a flor no meu jardim que você era. Mas com tanto espaço para novas mudas, não há motivos pra lamentar a sua partida. O jardim sobrevive sem você, mesmo que vá sentir sua falta. Sei que em algum momento, uma semente inesperada dará uma flor tão linda que o resto vai parecer somente grama desidratada. E é por isso que você é insubstituível, mas não imprescindível. O amor pode dar botão de flor a qualquer momento, é só preparar a terra e contar com os bons ventos.