sábado, 23 de abril de 2011

A mistura do mesmo sonho, aquele caminho (re)vivido.

E você vê só como tudo se mistura. Caminhamos para o mesmo centro, talvez. Quem sabe um encontro inesperado nos espere na porta do salão do baile. É como se voltássemos à infância e a vida estivesse lá, com os mesmos tons vibrantes, quiçá até outros mais, tão surpreendentes quanto os demais. Mas é um sonho, você sabe. Mais cedo ou mais tarde, iremos acordar.
- Que tenho eu com teus pretextos? Não é nada que eu queira justificar, então deixa-me ser criança nos teus braços!
Clamaram as apaixonadas, mas suas vozes nunca foram altas o bastante para penetrar no coração destes homens de ar francês, estupidamente elegantes. 
Os passeios de bicicleta, as canções tocadas à tardinha, o dia inteiro estendidos sobre a grama, rindo e contando as piadas da infância. As xícaras da vovó que preencheriam o vazio na prateleira de portas transparentes, aquela do cenário perfeito. O penteado do cabelo dela, suavemente anelado, simples e mágico, os fios de um preto negro, quase um abismo são os seus cabelos. O gin, aquela garrafa bonita, diria que é a mais bonita entre todas as outras garrafas do bar daquela casa.
- Você se lembra do perfume que eu te dei?
Uma borrifada pro alto, quase ao teto. As cortinas respingadas de cheiro de paixão. As mãos distantes, as alianças guardadas em suas respectivas caixas, tão longe! Mas o elo real está no coração de cada um, ainda tão próximo um do outro.
Era como se, ali mesmo, estivessem todos os seus possíveis sonhos juntos. Estavam quase enxergando. Os seus filhos crescidos, os livros de fábulas esparramados sobre o chão do quarto das crianças, as malas do casal quase que visíveis. Eram planos tão reais!
- Mas a gente planejou, lembra? Não podia planejar. Você sabe que não podíamos. Ninguém pode. É um sonho, nós sabíamos.
Sua voz era quase angelical, pensou ela. Mesmo assim, era como uma espada cortando-na o coração cada uma de suas palavras.
"Será que ele não vê o ainda tremer das minhas mãos?"
Eles são só crianças grandes. Há muitos campos floridos a desbravar. A moça vai. Talvez leve sua cesta camponesa, corra com seu vestido azul-bebê pelos jardins afora, ou então desfrute de bons cafés e livros, muitos, muitos livros! Quem sabe, em alguma tarde chuvosa, calce suas botas de couro, ponha seu sobretudo e passeie pelas ruas, ouvindo risos altos e tagarelices, isso a aliviaria. Ao menos, sei que distrai.
E o moço vai ao baile da sua cidade, revê os amigos. Conta-os os últimos acontecimentos, quem sabe as peripécias do último trabalho. Conta dela, sim, aquela linda moça que lhe roubou o coração. E por favor, não esqueçamos de dizer o quanto ele lembra a todos o quanto a ama. Fizeram-no. Seguiram até aqui, um sem o outro. Porque não há mais como voltar, nunca houve, ninguém nunca voltou ao que passou. Quem o diz fazer, está mesmo é mentindo, que todo o que faz pela segunda vez, e não é tão frequente assim, faz diferente, porque tenta consertar. Mas ela.... Mas ele... Mas eles... Eles sabem que não é um fim. Mas é, sim, um recomeço. Agora, algo impede de o Escritor voltar ao mesmo final? Não é um caso de "Corra, amor, corra!". Eles sabem, eles se amam. Nada mais vai deixá-los sós.
E você vê só como tudo se mistura. Caminhamos para o mesmo centro, talvez. Quem sabe um encontro inesperado nos espere na porta do salão do baile. É como se voltássemos à infância e a vida estivesse lá os mesmos tons vibrantes, quiçá até outros mais, tão surpreendentes quanto os demais. Mas sempre será um sonho, eles sabem. Mais cedo ou mais tarde, irão se deitar.

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