O coração que perdeu o encaixe.
Lembro
ainda hoje de nossas piadas, nossos jargões e nossa corrente. Inseparáveis que
éramos. Foi, talvez, o sentimento mais puro e mais intenso que em mim brotou.
Nossa amizade ficou marcada, apesar de o tempo borrar um monte de lembranças de
nós. Falando em nós, muitos foram os que atamos e desatamos. Muitos fomos nós. Talvez
o maior arsenal de faces que eu tenha descoberto em mim foi com você. Doeu
nossa separação, não doeu? Pra mim doeu. Foi lenta, estupidamente lenta. Aos
poucos te perdi. Deixei pra trás o meu abraço mais confortante. Tanta coisa,
tanta coisa! Eu juro pra você que, se eu fosse o pingente de coração de nossa
corrente, preferiria nunca ter existido. Pobre pingente solitário. Ainda amo a
maneira como ele reflete no sol e o encaixe perfeito que tinha com o seu. Pena os
dois nunca mais terem se visto.
Ainda
guardo as cartas e os rabiscos e as piadas e o texto que eu fiz pra você, e
você pra mim, todos em uma caixa forrada com um papel bem colorido, pra lembrar
nossa amizade arco-íris. Linda, intocável e imaculada amizade. Como pode ter-se
perdido? Quando relembro, surge a dor da distância incalculável de nossos
corações. Nesses últimos dias voltei a ouvir nossas músicas. Sim, nossas. E
junto delas vieram as historinhas sutis e as graças. Peguei-me rindo sozinha
tantas vezes! Temos um mundo todo particular. Talvez nem seja mais nossos. Nem
nós somos mais quem eram os “nós” daquele tempo de ouro. Minhas lembranças
mudas estão me petrificando... Queria que fosse impossível tirar um dia o seu
nome do meu coração. Hoje dói saber que podíamos ser nada mais do que somos
somente entre nós. Você poderia ser madrinha do meu casamento, dos meus filhos,
das minhas lembranças... Minha eterna madrinha.
Será
mesmo que nunca morreremos? Porque em mim tudo está tão vivo... Tão longe, mas
tão vivo! Somos cheios de promessas e cheios de contratos pela metade. Eu jurei
não perder a gente, e perdi, e você também perdeu, e hoje somos amigos que se
cruzam na rua com um sorriso amarelo, envergonhados de não termos corrido um
pouquinho mais. As fotos, as palavras perdidas no meio do conteúdo do caderno,
alguns vídeos e muitas lembranças fazem parte de um repertório só nosso,
cravado no fundo de um baú doloroso de se remexer. Disseram que “quando mais
mexe, mais fede”. Posso dizer que nosso aroma é doce, sempre doce. Os anos
passaram e nossa amizade estacionou em uma via muito movimentada. Movimentada demais
para querermos nos importar com seu peso. Tínhamos muitos outros para levar
dali adiante. Nossos corações decididamente pela metade. E sei que nem adianta
voltar, o “fardo” petrificou de tanto esperar para seguir conosco. Queria te chamar
para um café e pedir para você usar de novo a correntinha. Porque nunca deixei
de usar a minha, nem que seja em pensamento, a cada início de manhã que eu
olhava para ela pendurada no espelho e queria que tudo fosse inteiro outra vez.
Descobri que o tempo não nos faz esquecer...Mas aceitar! Adorei o post!
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